Os Braços

Author: Kalós Agathós /

Paulo Megamass

Sentiu uma leve dor nos braços. Nada disse, continuou seu trabalho. Há dois meses se curara, não podia ceder. Eram nove horas. Exatamente nove horas. Olhou a mesa. Muitos documentos. Não podia parar, mesmo com o desconforto. Lembrou-se de que tinha um remédio na gaveta. Abriu-a. Não o achou. A dor aumentara. Talvez, movimentá-los ajudaria. Ergueu-os, flexionou-os por várias vezes. Nada. A dor realmente aumentara. Google: "Dor Lancinante nos Braços". Infarto, Tendinite, Fibromialgia, Contratura. Nenhum diagnóstico. Deita-se no sofá da ante-sala. Estava só. Seus olhos procuravam em que se fixar. O incessante movimento do velho ventilador, a pliha de pastas sobre a mesa, os livros que nunca lera na estante. Desavisado,  espia o porta-retrato.  O mesmo sorrisso de todas as fotografias, a mesma expressão e o costumeiro olhar de quem luta para não fechar os olhos ao disparar do flash da câmera. Todavia, uma ausência o assombra: Seus braços. Não os vê em sua foto.

Roteiro de TV

Author: Kalós Agathós /

Autor: Sr. Santos

Cena 1 um

Um palco vazio

Cena 2 dois

Um homem vazio

Cena 3 três

Um copo vazio


Crônica de Tv

Caminhava. Chegou. Cantou. Sofreu. Alegrou. Errou.
Estranhou. Cansou. Arfava.
Bebeu. Caiu. (Via a Tv). Levantou. Pagou. Acabou.

Da Leitura

Author: Kalós Agathós /

Josias do Alentejo

Escrever sobre leitura. O inverso do anverso. Pergunta, pedindo a brejeira. Devaneio - palavras que pedem palavras. Palavras querem outras palavras. Paródia: engraçada, trágica, indigesta. Concatenação. COm + ação. www.com/ Enleio. Medeia. Medéia. Me ideia. Me deixa. Som on.

Romance Folhetim - Fragmentos

Author: Kalós Agathós /

Padre José
As tardes, quando regresso, são cinzas que se acumulam no diário ainda fechado. Mais um dia, as grades enferrujadas mumificam meu vigor.  Qual o ritmo? Frases entrecortadas para que o silêncio me torne mais humano? Olho a grama. Nada além. Cabe-me relembrar e esquecer que retorno.  Hoje, melancólica euforia rasga-me em palavras, fere-me numa ambiciosa vã vazia voz. Estaciono como se estivesse destinado a ocupar aquele lugar, abandonado. Talvez, seja isto: um corpo opaco num clarão.

Escrever

Author: Kalós Agathós /

De: Müller

Ex crê ver
És! Crê ver.

                                                                         ver e crer.

                                                                       Significantes

Signos ficantes                                                                                                               Signos antes ficam

                                                                                                                    


                                                                                                            DANÇantes


                                                

A Paixão de sua Vida

Author: Kalós Agathós /

De: Marina Colasanti

Amava a morte. Mas não era correspondido.
Tomou veneno. Atirou-se de pontes. Aspirou gás.
Sempre ela o rejeitava, recusando-lhe o abraço.
Quando finalmente desistiu da paixão, entregando-se
à vida, a morte, enciumada, estourou-lhe o coração. 

Manifesto onomapragmático 1

Author: Kalós Agathós /

Contra a inércia-

 Pancada, pancada, pancada.

Das disposições:

1- Não à convivência cordial com blogs, blogueiras, bloguetes;
2- Sim à polêmica, à mesa redonda, ao corinthianismo, ao vale-tudo e ao litígio;
3- Proibido acordos;
4- Crítica voluntária e injustificada;
5- Ofensa ao estilo de escrita e ao conteúdo de mensagem;
6- Contra o direito de resposta;
7- Sim ao uso de técnicas retóricas de má fé;
8- Sim à oportunidade de gerar incômodos;
9-  Não faço dez mandamentos.



Mergulhos

Author: Kalós Agathós /

Autor: Dentinho

Mergulho                                                                                                 nulo
                  ulho                  julho                     casulo                   pulo
                              ulho                                                    ulo

Mergulhos

Author: Kalós Agathós /

      Autor: Paulo Ganso


         Mergulho
          o olho
          no escuro

          Voo
          a dança
          do futuro

          O que serei
          depois
          de mim?

Vê se cabe no onoma

Author: Kalós Agathós /



Autor: Cirilo

As disposições legais a respeito dos temas e subtemas estratégicos dessa alçada de voo literário vão-se ficando claras, e aqui faço também pequenas sugestões sem grandes pretensões mas que evitariam tanto desconfortos abdominais como clericais. O uso da palavra "veludo" poderia ser evitado apenas por precaução, assim como "algodão". Só de pensar nessas palavras sendo mastigadas com os dentes causa arrepio. "Arrepio" pode.
Fuga de temas como fuga e/ou tema de fugas com tema deveriam ser levados em consideração frente à necessidade de invadir mais pausadamente e até in allegro as normas benguels vigentes e visigodas. Por medida de contensão fica restrito, por normas benguels internacionais, a apenas meia dúzia de toalhas e retentores Sabó, aquele que te dá um nó. Ovos de codornas liberados. Ah, lembrei, esquilo não pode.Aquilo pode. Esquivo não deve. Quem não deve não teme, por exemplo, é de uso convencional, portanto, restrito à situações onde não há qualquer outra saída silábica.
Palavras de caráter sexual como morango, avestruz, tanque, pernóstico, usar somente no sentido lateral da palavra. Palavras que associem o uso de drogas, como pamonha, lamparina, carrapato, chulé, são proscritas. Eu, por iniciativa própria e razões pessoais não usarei formações rochosas ou códigos com bilboquê ou bibloquê, pipoca doce, pastachuta e cheiro verde. Fica aí ao seu critério e muito me agradaria a sua compreensão nessa tão difícil vernacularidade. Feitos esses adendos vou ao banheiro:
 - despejar o barro
 - enforcar o mulato
 - passar um fax
 - chapiscar o vaso
 - lançar a massa
 - liquidar a pressão

Nua Lua

Author: Kalós Agathós /


Autor: Glauceste Satúrnio

Ela desperta nua, aos solavancos, desviando-se das lâminas de sol no travesseiro:
 - Como é passear nas nuvens?
 Ele traz o café:
 - Nada foi resolvido, além de tudo, sinto uma fraqueza em reverter meus pontos cardeais. Quer uma xícara?
 Ela gira, gira a colherzinha...
 - Que horas são?
 - Três.
 - A vida anda escondida de mim...
 - Vou fazer caretas na esquina.
 Ela põe o vestido amarelo e prende o cabelo:
 - Hoje eu sou parafuso.
 - Então vamos. Tentar entender a lua é coisa pra lunático.

Conto reconto desconto

Author: Kalós Agathós /

Autor: Paulo Leminsky

Numa rua sem números, um menino sem nome caminha numa data incerta. Pára! Errei.
Numa rua sem menino, numa data incerta, um sem nome caminha. Errei. Pára.
Caminha um nome numa rua sem data. Pára! - Errei? Incerta, sem números.
Errei numa rua sem número. Pára numa data incerta, ó menino.

Ismália sem complexo

Author: Kalós Agathós /

Autor: Anacleto Bianchi

Ô Ismália, desce daí !
O Marcel falou que vem
A Silmara já chegou
Vamos fazer festa
Tira essa fantasia de anjo
E dá um mergulho no aquífero:
Esfriar a cabeça
Depois a gente toma uma na esquina
Faz uma roda de samba
E deixa a noite entrar

acabou?

Author: Kalós Agathós /

cadê aquela gota que pingava sem parar
espuminha, travesseiro de vidro da memória
retorce lata dourada, vai, retorce
e brinda esse bem me quer

Pipoca-Pedra

Author: Kalós Agathós /


Uma pipoca. Uma pedra. Uma tarde. Uma Mãe. Outra mãe. Um encontro. Um elogio. Outro elogio. Que gracinha. Que branquinho. Que gordinho. Que fofinho. Uma pergunta: Quantos anos? Um ano. O Teu? O Mesmo. Já anda? Não anda? Como não? É estranho? Muito estranho. Ele anda? Anda muito. Desde quando? Nove meses. É verdade? Como não? Já fala? Até alemão. O seu? Só balbucia. Como assim? Nada fala. Que estranho? É estranho? Muito estranho. Come bem? Até picanha. Ele também? Apenas mama. Tua teta. Minhas tetas. Que safado. Será tarado? Bem estranho. É estranho? Muito estranho.  

Tradutor adutor infrator

Author: Kalós Agathós /


Ode 25 de Anacreonte

Ὅταν πίω τὸν οἷνον,
Εὕδουσιν αἱ μέριμναι.
Τί μοι γόων, τί μοι πόνων,
Τί μοι μέλει μεριμνῶν;
Θανεῖν με δεῖ, κἂν  μὴ θέλω.
Τί τὸν βίον πλανῶμαι;
Πίωμεν οὖν τὸν  οἶνον,
Τὸν τοῦ καλοῦ Λυαίου.
Σὺν τῶ̣ δὲ πίνειν ἡμας
Εὕδουσιν αἱ μέριμναι

Tradução 0

Em beber o vinho,
as inquietudes vinificam,
Lamúrias, penúrias,
Importam-me?
Sina – fenecer, sem querer.
Errarei pela vida?
Bebamos, pois, o vinho,
O de Baco, o belo,
Ao beber - em nós –
As inquietudes vinificam

                                                   Chico Xavier
Tradução 1

Quando bebo, dormem-me
os ruins cuidados.
Eu pensar solícito
em carpir meus fados?
Qual é d'isso o préstimo?
Pois (ou queira ou não)
hei de, entre os cadáveres
ter o meu quinhão.
Quando a vida rápida
me abre dous caminhos,
trocarei o flórido
por calcar espinhos?
Reine Baccho! Empinem-se
vasos redobrados!
Quando bebo, dormem-me
os ruins cuidados
                                                      Antonio Feliciano Castilho

Tradução 2
                                                               
Lull'd with wine my cares repose,
What, for me, are cares and woes?
Die I must, though Death distaste;
Why let Life, then, run to waste?
Come, my friends, the goblet share,
Gift of Lyaeus the fair.
We propose, by drinking deep,
Grief and care to lull asleep.
       James Usher
 

O Voyeur

Author: Kalós Agathós /


O pássaro sem pudor me olha. Com medo, mas me olha. Um olho. Um mísero olho. Talvez se sinta protegido com sua semi-ótica.  Penacho ereto, erótico. Nada mais fácil do que a negra proteção. Chumbinho. Espingarda. Repressão. Politicamente correto:  falemos de sua cor (...).

Ismália is malária

Author: Kalós Agathós /



Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...
 Alphonsus Guimaraens

Febre, altura, pavor.

Da Sangria do Tempo

Author: Kalós Agathós /

Da Sangria do Tempo
Autor: Ignácio Robledo Ui

Nesses tempos tropicais, el niños e niñas zumbindo a dança das chuvas e as gotas escorrendo pelos maxilares, olhos vermelhos e o corpo pedindo tempo. Dos meus antepassados sangrados até a última gota e experiências pouco metódicas deixo uma receita esses dias.

A Sangria:

Com um punhal faça um golpe certeiro nessa bolha envolvente do tempo, abrindo uma rota de fuga, um corte na pele, deixando vazar o vermelho por entre os dedos, ó tempo, que de gole em gole nos embebeda e turva a jarra que já deve estar à mão.

Corte pedaços de abacaxi pérola, pedaços de maçã verde, pedaços de pêssego em calda, pedaços de laranja descascadas com amor. Sim, com amor, se é que me entendem. Outras frutas a gosto, tudo colocadas na jarra e vinho escorrendo pelas encostas de vidro até a metade, completada com Sprite ou água com gás.

Faça quantas quiser. Acompanhe com o que lhe satisfaça, um nome, um conceito, um discurso, queijos, carnes ou sexo.
Afinal de contas , o que é isso?

Horácio: Ócio e Negócio

Author: Kalós Agathós /

Das coisas (des)importantes: falemos.
Autor: Rui do Jazz

Desaprender o que é tempo e aproveitar o tempo. Saber o que é tempo é negá-lo. Quem nega o tempo, nega o ócio, faz negócio. Horácio. Hora e ócio (brilhante leitura de Vicentis Golfetus). Horácio = Hora e Ócio. Por isso, talvez, Horácio tenha sido poeta. O estranho que a palavra poeta vem do verbo grego poieo (fazer). O homem que dedicava suas horas ao ócio fazia algo. Intrigante isso, para não dizer... que cuzão! 

Conversando sobre Horácio, numa tarde úmida de verão, sentia que... que... estava quente. Encerrei o assunto. Falei do tempo.

 (Rápida reprodução verossímil e sintética do evento)   

_ Como a vida passa, não?

_ É verdade.

_ E esse calor, que coisa maluca!

_ Nem me fale. Não consigo dormir sem ventilador (...)

Sejamos simples: Papinhos e calor = refrescar as ideias


Outra coisa: Ambos perdemos tempo aqui. Eu que escrevo e você que lê. Agora que leu até aqui, não vai se queixar de ler o que Horácio escreveu:



Tu ne quaesieris, scire nefas, quem mihi, quem tibi
finem di dederint, Leuconoe, nec Babylonios
temptaris numeros. ut melius, quidquid erit, pati.
seu pluris hiemes seu tribuit Iuppiter ultimam,
quae nunc oppositis debilitat pumicibus mare
Tyrrhenum: sapias, vina liques, et spatio brevi
spem longam reseces. dum loquimur, fugerit invida
aetas: carpe diem quam minimum credula postero.

Tradução

Não interrogues, não é lícito saber a mim ou a ti
que fim os deuses darão, Leucônoe. Nem tentes
os cálculos babilônicos. Antes aceitar o que for,
quer muitos invernos nos conceda Júpiter, quer este último
apenas, que ora despedaça o mar Tirreno contra as pedras
vulcânicas. Sábia, decanta os vinhos, e para um breve espaço de tempo
poda a esperança longa. Enquanto conversamos terá fugido despeitada
a hora: colhe o dia, minimamente crédula no porvir.

Como aceitar o tempo, meu dileto poeta? Como beber vinho com 33 graus Célsius?



O Valor da Mentira

Author: Kalós Agathós /

Não tenho nada para escrever. Talvez, por isso, escreva. Escrever mal ou bem: não importa! (Será?). Como é delicioso (e enfadonho) deixar rastros de uma imagem a quem me lê. Pois bem: deixe me ausentar - vou discutir um assunto (acredite se quiser na imparcialidade hermética de qualquer  ideia ).  Curiosamente ( quem sabe, um trauma de infância me motive), revelar já na  primeira postagem a essência (?) desse blog: ser um espaço de Mentira e de Valor. Antes: vou confessar - nunca entendi as palavras direito - fui consultar o Houais. Não sei o que é mentira, muito menos o que é valor. Estupefato, descobri que eu e meu blog somos orgânica e inorganicamente mentirosos e dotados de valor. Vamos aos discursos (...)

 

Sobre o Valor:

De acordo, com o dicionário em suas "duas" primeiras acepções (a posição dos enunciados são aleatórias?), valor é:

1 recebimento ou paga em bens, serviços ou dinheiro por algo trocado

1.1 quantidade monetária equivalente a uma mercadoria, em função de sua capacidade de ser negociada no mercado; preço

Ex.: pagou em prestações o v. do eletrodoméstico
 2 preço alto, elevado

Duas Considerações:

1- O que é 1.1? Nunca entendi o que seja 1.1;

2- A palavra evoca acordos humanos para quantificar a importância de um produto, serviço, bem e outros. O que me fascina:  vender bem ou mal um "acordo"... Como é poderoso e estimulante fazer o outro acreditar e desacreditar do valor de meu produto...

Que devaneio... o meu, é claro. Como nunca fui o melhor em nada... gosto sempre dos significados esquecidos ou adiados das coisas. Fujamos, pois, das posições - 1, 1.1 e 2.

Vejamos a acepção  seis e seis ponto um (números sagrados no Orfismo):

6
qualidade humana de natureza física, intelectual ou moral, que desperta admiração ou respeito
Ex.: o v. daquele cientista é inestimável

6.1 ausência completa de medo; valentia, coragem, intrepidez qualidade humana de natureza física, intelectual ou moral, que desperta admiração ou respeito preço alto, elevadoDuas considerações e meia:

1- Adoro o Orfismo ( nada sei sobre isso).

2- A finalidade de pensar a palavra Valor na acepção órfica me é desconhecida.

Conclusão: Valor ---- Preço 1 x Outra coisa 6 (Goleada)


Saiamos da confusão: Pensemos na Mentira (...) Voltemos ao Houais:


2 ato ou efeito de mentir; engano, falsidade, fraude hábito de mentir



Como a mentira é familiar ao valor...(Que coisa). É ela também uma forma de interação... uma ação ... um discurso...Como tal, transformável, amável, inefável.

Vamos à acepção 8 da palavra mentira (Cansei-me do Orfismo...evoco agora o Nouveaulism):

Rubrica: culinária. Regionalismo: Rio de Janeiro.
Biscoito preparado com massa de pão-de-ló, na forma de um pequeno disco; mentirinha

Entre o valor e a mentira: Vale a pança cheia!

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